“Le souvenir est le parfum de l´âme” – (George Sand).

Sem opção

22 comentários

Ainda este livro

É a 8ªedição e custou 35 escudos.

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(Já não encontrei cifrões nos teclados: o início da perda da nossa soberania).

Este livro é o retrato de uma geração.

Quando era mais nova pensava que sabia como tinha sido a vida das minhas avós e bisavós.

E sentia-me com alguma soberba ao comparar a minha vida com a delas.

Atingi a formação e a autonomia com que elas não sonharam.

Hoje vejo que, apesar do ganho ser evidente, também houve perdas e que a última vantagem: a autonomia, a independência, a liberdade é muito aparente.

Antigamente, as mulheres tinham de ser perfeitas donas de casa, mesmo que não sentissem dentro de si o apelo e vocação para tal.

Uma ida à praia implicava uma tarde na cozinha.

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Era exigente?

Era, sobretudo se não havia uma apetência especial pelos tachos.

E, hoje, temos uma vida menos exigente?

Espera-se menos perfeição das tarefas da profissional, mãe, ser social, mulher?

De tal forma andamos mergulhadas nas tarefas urgentíssimas que passar uma tarde na cozinha é impossível, mesmo que haja uma apetência natural pelos temperos e aromas do mundo culinário.

Significa que queira voltar aos anos 30?

Não.

Significa apenas que queria viver em 2013 mais devagar, com menos exigências e, sobretudo, com direito de opção.

Atingir a Liberdade é poder escolher.

E desse ponto de vista estamos muito longe de alcançar a Liberdade, enquanto mulheres e enquanto seres humanos.

Se me apetecesse preparar uma ida à praia com todos os requintes, isso devia ser permitido.

Se eu desejasse ficar entre a sala e a cozinha, essa opção devia ser facilitada, permitida e bem vista.

Em 2013, uma mulher optar por desenvolver uma actividade em casa e investir na formação nos filhos é um tema que continua a ser tabu e uma opção dificultada por toda a sociedade: estrutura e cidadãos.

O que é completamente coerente com a política vigente: quem não é produtivo e não vive pelo dinheiro deve ser cilindrado.

Quanto ao livro do início, a mulher que sou repudia o título, por intuir nas palavras A mulher na sala e na cozinha, a falta de opção.

Mas a mulher que sou repudia com a mesma convicção a falta de opção da mulher do século XXI.

Autor: Frasco de Memórias

http://frascodememorias.com

22 thoughts on “Sem opção

  1. Gostei muito deste artigo, Ana. Partilho da mesma opinião. Beijinho

  2. Ana,

    Acho que tens muita razão.
    Como eu te entendo !
    Todos num reboliço…sempre a 100 à hora, muito desgaste e montes de tempo perdido em tarefas frustantes.
    Basta ver a nossa profissão…tanto tempo roubado a causas importantes.
    Hoje ,independentemente do género,acho que regredimos todos em ” qualidade de vida “… e tu ainda vives num ambiente calmo…
    É muito importante, as pessoas poderem ser autónomas económicamente(nada pior do que estar nessa dependência)…mas é muito difícil conseguir conciliar o papel de pais,profissionais e ter tempo para poder ser feliz ( ter interesses e fazer as coisas de que gosta ! ) Ter prazeres na vida !
    Pode ser-se feliz ,fazendo coisas muito simples ,mas com tempo ! ( fazer um bolo,um doce,bricolage…visitar uma feira…passear,etc. )
    Agora os “ovos verdes “… olha, fiquei todo partido ! Invejoso ! 😉
    Adoro !
    Costumo comer em casa dos meus pais.

    Conclusão : deviamos trabalhar todos metade do tempo !

    Um beijo,
    José

    • Subscrevo, José!

      Ando a lidar muito mal com a velocidade que nos é imposta.
      Até para conversar parece não haver tempo…

      Ai, os “ovos verdes” 😉

      Beijo,

      Ana

    • Adoro a Elis e esta música…
      E fiquei com muitas saudades da minha casa no campo!

      Agora vivo na cidade…
      Nunca mais chega a Primavera para encher tudo de vasos floridos!

  3. Ana, excelente postagem. Fiquei feliz de ver tudo isso escrito. Tinha a impressão que nenhuma mulher se colocava a pensar nisso. Gostei da sua inteligente opção de viver a seu modo o 2013. Assim fica melhor. Procurar o melhor para você e sua felicidade e deixar de lado o cumprir modismos. Gostei muito.
    Um beijo,
    Manoel

    • Manoel, ainda não consegui concretizar esse meu desejo…
      Para já, não tenho opção 😦
      Continuo a aguardar dias mais felizes, a nível profissional…

      Um beijo,
      Ana

  4. Esta nossa sociedade, com os valores postos no consumo e na imagem (e não é por acaso que os políticos actualmente têm consultores de imagem…), não tem liberdade possível – estamos todos, de uma maneira ou de outra, uns mais e outros menos – tolhidos e limitados em muitos sentidos. Com muitas imposições. Sem tempo e sem espaço. E não há qualidade de vida possível, não há liberdade possível, sem tempo e sem espaço!
    Só que a maior parte das pessoas nem se apercebe disso, acha que é «normal», que é assim que tem que ser. E fazem todos os possíveis para que aqueles de nós que agimos (ou tentamos agir) contra esta corrente «política e socialmente correcta» nos sintamos deslocados, isolados, incapacitados…
    Acho que me estou a afastar do tema, mas é curioso que ainda hoje li um artigo de um historiador, que compara os actuais centros comerciais aos primitivos locais de rituais de culto:
    http://vincemichael.wordpress.com/2013/11/29/megafauna-megaliths-and-megamalls/

    • Sem tempo e sem espaço!
      Como é que é possível?
      Dois bens que existem e que só nós, enquanto sociedade, estamos a eliminar…
      Não consigo compreender…
      E, é verdade, quem não está no turbilhão é inadaptado e revela fraqueza.

      Acho que o post vem a propósito: os centros comerciais fazem parte dos rituais de alienação…
      Obrigada pela partilha!

  5. Assino e subscrevo. Já a bem pouco tempo falei dessa falta de liberdade de escolha. Ao fim ao cabo ser-se emancipada significa escolher. O problema é que quando uma mulher escolhe ficar em casa, muitas das primeiras pedras que apanha vêm de mulheres. Como se a opção delas fosse menor ou proibida. Da mesma forma que não censuro uma mulher por escolher ser uma profissional e não constituir família, também não julgo uma que queira dedicar-se ao oposto. Enfim, em vez de nos apoiar-mos umas ás outras, e as diferentes opções de vida que temos, é mais comum fazermos criticas.

  6. Como compartilho a tua opinião, mas hoje foi um dia de calma passado com o meu filho a saltar em cima da cama, a dançar, a cantar, a cozinhar, fizemos pão quentinho para o lanche e iogurte para o pequeno almoço de amanhã, lemos historias, pintamos, etc, enfim tudo o k nos apeteceu. Nada de trabalho, por isso hoje pude escolher mesmo k seja só um dia e k provavelmente na próxima semana tenha um ataque com tudo o k falta fazer: na sala e na cozinha e principalmente fora dela. Visto k nem sempre temos a liberdade de escolha temos de nos alegrar por haver uns dias em k isso é possível e desfrutar ao máximo bom fim de semana

    • É verdade, Liliana!

      Devíamos ter assim vários dias por semana.
      Também faço iogurtes 😉

      O que está errado é que viver/estar com os filhos, sem relógio, seja uma excepção que se paga depois, com a acumulação de trabalho que não se fez.

      Mas tens razão: o lado positivo é que ninguém nos rouba esses poucos momentos só nossos.

      Beijinhos para ti e para a tua família!
      Que saudades que eu já tenho da Figueira da Foz 😉

      Ana

  7. Oi, Ana, encaramos inúmeras jornadas diárias, nas mais diversas atividades, para dar conta de tudo. Sinto que corremos cada vez mais simplesmente para permanecer no mesmo lugar. De dois anos pra cá tento andar com mais calma, resolvi me dar tempo até para aquelas coisas que não clamam por urgência, mas que arejam a mente dos compromissos duros do cotidiano. Fiz escolhas, claro, deixei algumas pelo caminho, não dá pra conciliar tudo no final das contas, mas a gente descobre outras prioridades e muitas vezes acaba percebendo que o “urgente” que considerávamos essa só uma questão de hábito. Beijo e ótimo domingo.

  8. Olá, Helka,

    O meu grande desafio continua a ser “desacelerar”: já consigo mais do que conseguia, mas tenho um longo caminho pela frente…
    É muito difícil resistir a este movimento acelerador global!

    Um beijo e uma óptima semana (tranquila)!
    Ana

  9. A minha tia de 80 anos, mulher determinada e cheia de gana, uma vez disse-me a propósito da vida antes do 25 de Abril que “o que naquele tempo havia de menos, hoje há demais e; o que que havia demais, hoje há de menos!”
    E concordo imenso com ela! Porque se antes uma mulher que queria sair da “vida doméstica” era mal vista pelos demais, hoje vemos precisamente o inverso. Como muito bem descreves neste post

    • O problema reside precisamente no excesso: concordo totalmente com a tua tia!
      E ela saberá melhor do que ninguém porque viveu/vive nestes dois momentos…

  10. Pingback: Recuperar |

  11. Sinto exactamente o mesmo. E lamento que a sociedade continue a olhar de lado para a mulher que opta por ficar e trabalhar em casa. O preconceito é imenso…

  12. É enorme!
    E é uma opção em que é preciosa a ajuda e compreensão de todos… o que nem sempre acontece!

  13. Pingback: 132: Starts with Klee’s Painting. Ends with Book Illustration. | Almofate's Likes

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