Numa altura em que pouco se conversa; porque corremos loucamente; porque as redes sociais fingem que socializamos; porque somos individualistas e adoramos monologar cheios de certezas… andava com umas saudades loucas de uma boa conversa!
Agostinho da Silva disse, nas Conversas Vadias com o MEC (há 300 anos!), que uma conversa era sempre melhor do que um livro! Lembro-me de que, nessa entrevista, o jovem MEC enfureceu-se e o Agostinho da Silva termina a entrevista a dizer que o MEC é “mauista” num trocadilho com “maoísta”.
Ultimamente, tenho andado deliciada com o Curso de Cultura Geral, da Anabela Mota Ribeiro, agora numa pausa que espero que seja breve!
Uma das conversas de que mais gostei, da última temporada, teve como convidados: o gestor António Costa Pires; o sociólogo Rui Pena Pires e o ilustrador Pedro Vieira.
Apontei alguns pontos para reflexão, citados livremente dos intervenientes deste Curso:
1-A propósito da Ilíada, de Homero, o alicerce da literatura ocidental:
-Já na epopeia grega, há mais de 2000 anos, fica claro que, no final de uma guerra, não há vencedores nem vencidos;
-É evidente que o problema intemporal da Humanidade é a relação vida/morte.
-A vocação predadora do ser humano está presente nos clássicos; infelizmente, nós não aprendemos nada ao longo da História.
2-A propósito de Dostoiévski:
-Dostoiévski inventou o “homem derrotado pela vida”.
-Na verdade, o sentido último da vida é falhar cada vez melhor. O culto do êxito e do sucesso a todo o custo, de esmagar o outro, da competição desenfreada, destrói os próprios alicerces da civilização.
-Nós não olhamos para os que falham. Em Portugal, temos mais de dois milhões de pobres!
3-Ainda com Dostoiévski e Recordações da Casa dos Mortos:
-Na prisão, a cordialidade tácita que existe entre os homens desaparece.
-A selvajaria humana, o carácter predador da raça humana, a crueldade que está inscrita nos nossos genes vêm ao de cima; o núcleo do incomunicável (aquilo que não contamos mesmo a ninguém) transparece.
-Um regime totalitário descarrega toda a sua raiva nos presos políticos. Apaga-se a brasa da consciência humana, tal como já aparece descrito no livro Recordações da Casa dos Mortos.

4-Referiu-se o conto “Encontro em Samarra”:
Novamente a relação vida/morte. Como escapar?
Havia um comerciante em Bagdade que mandou o seu servo comprar provisões ao mercado, e daí a pouco o servo voltou, pálido e trémulo, e disse: «Senhor, agora mesmo, quando estava no mercado, fui empurrado por uma mulher, no meio da multidão, e quando me voltei vi que fora a Morte quem me empurrara. Ela olhou-me e fez um gesto ameaçador; por isso, empreste-me o seu cavalo, e sairei desta cidade, para escapar ao meu destino. Irei para Samarra, e aí a Morte não me encontrará». O comerciante emprestou-lhe o seu cavalo, o servo montou nele, enterrou-lhe as esporas nos flancos e partiu tão velozmente quanto o cavalo podia galopar. Então o comerciante foi ao mercado e viu-me, de pé, entre a multidão; aproximou-se de mim e disse: «Por que fizeste um gesto ameaçador ao meu servo quando o viste esta manhã?». «Não foi um gesto ameaçador», respondi, «foi apenas um sobressalto de surpresa. Fiquei espantada por vê-lo aqui, em Bagdade, pois eu tinha um encontro marcado com ele esta noite, em Samarra». (todo copiado daqui!)
5-Falou-se de Norbert Elias e do futebol como um processo civilizacional!
-Um dos processos civilizacionais foi a a autocontenção de emoções. No entanto, o que possibilita a harmonia em sociedade tem um defeito: torna a vida do dia-a-dia uma chatice. O sociólogo alemão defendeu que o futebol consiste na busca da excitação que permite compensar, de forma controlada, este quotidiano aborrecido.
6-E viajou-se:
O Irão é um dos países mais estereotipados na civilização ocidental, mas é um dos países mais belos do mundo: tem 5000 anos de história.
Fiquei com vontade de ler A Conferência dos Pássaros.

6– Por fim, o futuro e a esperança:
O ser humano tem de viver com mais decência e isso só se consegue com cultura, não num sentido restrito de definição de cultura e alta cultura, mas com produtos da mente humana que nos ajudem a controlar a força e a violência!
Este post é para ti, Teresa!
Eu fico a torcer por mais uma temporada de Curso de Cultura Geral!
Todos os episódios estão disponíveis aqui!
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