“Le souvenir est le parfum de l´âme” – (George Sand).

Sábios

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O grande Ulisses nunca me convenceu.

Extraordinário guerreiro, sem dúvida: lutou, venceu, viajou e voltou para casa, onde a fiel esposa o esperava, vinte anos passados.

No mundo ocidental, durante mais de dois milénios, a Odisseia conduziu-nos, simbolicamente, para o modelo ideal masculino e feminino: Ulisses e Penélope.

É uma obra incrível, sem dúvida, mas os papéis desempenhados pelo par amoroso sempre me perturbaram.

O homem abandona o lar, por uma nobre causa para a época: a guerra com Tróia, e a mulher fica, cria o filho e governa o reino. Não deixa de ser um grande destino o de Penélope, mas nem por isso é valorizado, se comparado com a panóplia de aventuras exóticas do marido.

Finalmente, Teolinda Gersão esclarece o meu desconforto em relação à Odisseia:

Na realidade, Ulisses revelou-se imaturo e incapaz de assumir o papel de número 2 no lar, depois do nascimento do filho Telémaco. Para além disso, estava demasiado disponível para cair de amores por outra mulher (na terra e no mar – ui, as sereias!), sempre com ar de vítima, e acabou por fugir de casa com um excelente alibi: a guerra.

Fiquei mais tranquila com a análise de Teolinda Gersão, mas a minha desilusão com os sábios gregos continuava.

Foi novamente a escritora que me apaziguou.

Na verdade, a Odisseia é uma obra que tem a sua origem na tradição oral e havia muitas versões do poema.

No século VIII a.C., Homero apenas fixou (sublimemente, sem dúvida) a versão de que gostou mais… e que lhe era mais conveniente, talvez.

Havia versões, todavia, que relatavam que Penélope refizera a sua vida na ausência de Ulisses e que o herói, vinte anos depois, ao ver uma nova Penélope, acabava por abandonar Ítaca;

havia ainda versões bem mais ousadas que referiam que Penélope dormira com os seus mais de cem pretendentes!

Mesmo tendo sido durante vinte anos, não deixa de ser um feito extraordinário… e extremamente emancipado para a época!

O que é incrível é que nestas diferentes versões que se perderam perpassa uma moralidade bem mais acutilante do que a registada por Homero, no que diz respeito à dinâmica de um casal.

Uma lição válida para mulheres e homens, como é óbvio:

se descuras o teu amante e partes (e não precisa de ser por 20 anos!) é natural que, na volta, ele lá não esteja impávido à tua espera.

Esta, sim, é uma mensagem sábia!

E os gregos sabiam-na há mais de 2000 anos!

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Autor: Frasco de Memórias

http://frascodememorias.com

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