
Segundo os últimos dados da DGS, o número de infectados continua a aumentar e, desta vez, o Alentejo não sai ileso. Não sei se é por isso, mas tenho sentido as pessoas muito mais tensas e com o modo conflituoso ativado.
Também pode ser porque voltei a trabalhar fora de casa, saí da minha doce bolha-lar, caminho pela rua e vejo mais seres taciturnos, irritadiços, impacientes e inquiridores.
Li que a pandemia irá prolongar-se no tempo e que os cuidados a que estamos obrigados agudiza os espíritos potencialmente neuróticos.
O vírus assusta-me, mas também tenho medo de ser atingida por esta neurose social.
Para já, noto que, contrariamente ao que eu julgava no início da pandemia, estamos a perder a empatia e o sentido de humor.
Será porque estamos literalmente amordaçados e deixámos de ver o sorriso do outro?
Será que a falta de abraços está a afectar irremediavelmente a nossa saúde mental?
Há muito tempo que não ouço uma gargalhada fora de minha casa. Gritos coléricos vindos da rua, infelizmente, tenho ouvido com alguma frequência.
♥
Juan Vicente dá-nos instruções para atravessarmos o deserto do mundo.
E dá-nos uma chave: o humor.
Se perdermos essa habilidade, perderemos uma grande parte da nossa capacidade de resistir e uma das nossas características mais humanas.
Se Eu Fosse A Ti
Se eu fosse a ti amava-me, telefonava,
não perdia tempo, dizia-me que sim.
Não hesitava mais, fugia.
Dava o que tens, o que tenho,
para ter o que dás, o que me darias.
Soltava o cabelo, chorava
de prazer, cantava descalça, dançava,
punha em fevereiro um sol de agosto,
morria de prazer, não punha
nenhum “mas” a este amor, inventava
nomes e verbos novos, estremecia
de medo perante a dúvida de que fosse
só um sonho, fugia
para sempre de ti, de ali, comigo.
Se eu fosse a ti amava-me.
Dizia-me que sim, vinha
a correr para os meus braços,
ou pelo menos, sei lá, respondia
às minhas mensagens, às minhas tentativas
de saber que é feito de ti, telefonava-me,
que será de nós, dava-me
um sinal de vida, se eu fosse a ti.
Juan Vicente Piqueras, Instruções para Atravessar o Deserto

Fotografias de mergulhos: IGNANT.
2 de Julho de 2020 às 22:49
Penso igualmente que se sente agora, mais que nos meses anteriores um evidente cansaço e tensão nas pessoas.
Creio que estamos todos fartos de andar “desconfiados”, de não sermos nós ao natural e principalmente de estarmos a lidar com algo que não tem uma data prevista para terminar. Sem perspectivas.
E isso cansa… cansa muito…
3 de Julho de 2020 às 21:02
Dulce, estamos todos a acusar o cansaço, sim.
Oxalá nos mantenhamos saudáveis, lúcidos e amáveis até ao fim!
Um abraço!
23 de Julho de 2020 às 14:49
Por aqui, cara mia, a minha paciência se esvaiu. Mas, o humor não se perdeu. Cansei de ver as pessoas agirem como se estivessem em um maldito mundo paralelo onde o vírus não existe e podem agir sem preocupação consigo, pior, para com o outro. É bizarro. Mas temos no comando da Nau Brasil, um bufão… não é surpresa o comportamento de parte dos seres brazilianos.
Eu atravesso a rua e penso em mi e nos que amo. Não sou negacionista, nem terraplanista… tampouco bolsonarista. Eu nunca tive apreço por determinados tipos e desde a infância que tenho horror a palhaços. rs
bacio e se cuide
23 de Julho de 2020 às 18:54
Partilhamos esse horror a palhaços, Lunna!
Como é possível que cheguem a presidentes?
Mesmo sem Bolsonaro, o clima aqui também é muito tenso.
O distanciamento social traz outros distanciamentos que ninguém previu: o afetivo, o empático e o humanitário são só alguns deles!
Votos de muita saúde e muito humor, contra todas as expectativas. Também ando por aqui a acreditar que o tal do bicho não gosta de corpos sorridentes. Oxalá!