A escolha de Aquiles marcou a minha juventude, mas já na idade adulta passou a fascinar-me muito mais a escolha de Ulisses.
Ulisses encalha na ilha da perfeita Calipso e mantém-se no limite da encruzilhada dilemática durante sete anos.
Não se pode dizer que tivesse sido um homem especialmente indeciso, mas há escolhas francamente difíceis.
Calipso apresenta-lhe o dilema:
Ulisses pode viver idilicamente, fazer amor com uma deusa e manter-se eternamente jovem e imortal, numa vida sem sobressaltos e prazerosa;
Ou Ulisses pode regressar à Penélope menopáusica, a um filho adolescente e a um pai decrépito.
Após sete anos irresolutos, Ulisses despede-se, finalmente, da sua ninfa:
“Deusa, não te zangues comigo. Sei muito bem que Penélope é inferior a ti, mas ainda assim desejo ir para a minha casa e ver o dia do regresso. Se algum dos deuses me maltratar no mar vermelho como o vinho, suportá-lo-ei pacientemente.”
E zarpou da ilha, feliz por abrir as velas ao vento.
O sábio Ulisses prefere a vida humana, imperfeita, humilde e efémera, mas real, a viver uma miragem alucinógena, tão monótona quanto superficial.

Nos dias em que estou cansada, não teria a coragem de Ulisses e cairia nos braços da deusa da ilha.
Nos dias em que consigo ser lúcida, beijaria Calipso durante um fim de semana e correria, no Domingo, para casa.
Mais uma vez, foi o incrível livro da Irene Vallejo, O Infinito num Junco que me fez repensar as escolhas da vida de Ulisses e de todas as vidas humanas.
O quadro é de Richard Westall (1765-1836), “Telemachus landing on the isle of Calypso”.