– O teu Tio vai dar todos os fatos, excepto um, que guardará para a viagem.
– Viagem? Qual viagem? O Tio vai viajar?
– Não… vai usá-lo na última viagem.
Foi com muito espanto que ouvi a minha Tia referir a palavra “viagem” neste contexto, até porque para mim o meu Tio ainda é um homem vigoroso e muito activo.
Mas a verdade é que parece haver uma altura da vida em que se pensa mais no final da “viagem”… mesmo que para todos este ainda esteja, evidentemente, muito longe.
“Viagem”, enquanto metáfora do nosso percurso de vida, está presente no nosso quotidiano e na literatura.
Lembrei-me do conto “A Viagem do Elefante”, de José Saramago.
José Saramago escreveu-o no fim da vida, depois de ter tido conhecimento de uma impressionante história real:
“O livro narra uma viagem de um elefante que estava em Lisboa, e que tinha vindo da Índia, um elefante asiático que foi oferecido pelo nosso rei D. João III ao arquiduque da Áustria Maximiliano II (seu primo).
Isto passa-se tudo no século XVI, em 1550, 1551, 1552. E, portanto, o elefante tem de fazer essa caminhada, desde Lisboa até Viena, e o que o livro conta é isso, é essa viagem”.
O duro percurso do elefante e o seu triste destino são uma evidente metáfora da vida humana.
Os livros que lemos interligam-se com os nossos momentos de vida e eu, para ser sincera, há cinco anos, não consegui identificar-me com este elefante.
Faltou-me maturidade.
Para além disso, tenho uma relação demasiado filial com Saramago:
sinto-me sempre como a neta a quem o Avô (narrador/Saramago) está a contar uma história…
portanto, inconscientemente, sou pequenina e estou ainda longe sequer de atingir metade da minha esperança de vida, o que não é bem verdade…
Para quem já cresceu, viajar com Saramago é duplamente maravilhoso.
As fotografias são do espectáculo “A Viagem do Elefante” Trigo Limpo Teatro ACERT que está em digressão durante este ano. Passaram pela Figueira e eu fiquei tão impressionada que quero reler o livro.
Parecendo que não, em 5 anos, devo ter crescido alguma coisa…
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